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Monitoramento remoto e produtividade: até onde vai o controle legítimo sobre os colaboradores?

  • Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por  Leticia Carmo
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*Adriana Melo

O recente anúncio do Itaú sobre a adoção de ferramentas mais rígidas de monitoramento remoto reacende uma discussão central sobre o futuro do trabalho no Brasil: os limites entre produtividade, ética e direitos trabalhistas. O tema ganha relevância porque não se trata de uma empresa qualquer. O Itaú é um dos maiores bancos privados do país, com resultados financeiros robustos e um retorno sobre o patrimônio (ROE) superior a 23%.

Ainda assim, optou por reforçar práticas de monitoramento sobre seus funcionários, levantando questionamentos que ultrapassam o aspecto financeiro e tocam o âmago das relações de trabalho.

A justificativa oficial do banco é clara: aumentar a eficiência. Mas a questão que se impõe é outra: até que ponto o controle remoto é legítimo e quando ele passa a configurar um mecanismo de controle excessivo? Em um contexto de incerteza econômica, a pressão pela resiliência e produtividade é real.

Contudo, demissões sob a justificativa de “falta de entrega”, em um banco extremamente lucrativo, revelam contradições e abrem espaço para um debate mais profundo sobre a transparência corporativa e o respeito à dignidade do trabalhador.

Monitoramento no home office: eficiência ou invasão?

Monitorar cada clique pode parecer um caminho rápido para aumentar a eficiência, mas a literatura acadêmica aponta efeitos contrários: a vigilância excessiva tende a corroer a confiança, aumentar a ansiedade e até estimular práticas de sabotagem. No Brasil, o poder de direção do empregador é legítimo e reconhecido pela CLT, mas ele encontra limites claros na privacidade e na dignidade do trabalhador.

No home office, esse debate ganha contornos ainda mais delicados. A casa do funcionário carrega uma expectativa natural de privacidade, e medidas como acionamento de webcams para vigiar a rotina já são vistas não apenas como antiéticas, mas potencialmente ilegais.

A LGPD adiciona uma camada crucial de responsabilidade: qualquer coleta de dados pessoais, de registros de teclado a imagens, deve respeitar princípios como necessidade, proporcionalidade e consentimento informado. Empresas maduras, conscientes desses riscos, têm buscado incluir cláusulas específicas de ciência e consentimento em suas políticas internas para proteger tanto a instituição quanto o empregado.

Mais do que um dilema jurídico, a questão é cultural: produtividade não nasce de vigilância, mas de confiança, clareza de metas e propósito. Transformar a sala de estar do colaborador em uma extensão da segurança corporativa é um retrocesso que mina a lealdade no longo prazo.

Produtividade e ética: um equilíbrio necessário

O futuro do trabalho não pode ser pensado apenas em termos de métricas frias. A ética precisa caminhar lado a lado com a busca por resultados. Modelos baseados em metas claras, feedbacks construtivos e autonomia mostram-se mais eficazes do que a insistência em controlar horários ou exigir “presença digital” constante.

Com novas tecnologias, muitos profissionais conseguem entregar em menos tempo o que antes demandava uma jornada de oito horas. Isso desafia a visão tradicional de produtividade, ainda ancorada em presença física. Gestores inteligentes compreenderão que o fundamental é o cumprimento de entregas de qualidade e que a liberdade para organizar a rotina tende a elevar tanto o engajamento quanto os resultados.

Ao contrário, práticas invasivas como webcam ligada ou captura contínua de tela criam medo e desgaste emocional. A gestão por resultados, respeitando os limites legais e pessoais, não apenas preserva a ética: garante também maior engajamento e lealdade de longo prazo.

Transparência nas métricas e a legitimidade das demissões

Outro ponto central é a transparência. Usar métricas para justificar demissões exige comunicação clara e critérios justos. A CLT assegura o poder diretivo, mas a LGPD exige que os trabalhadores sejam informados previamente sobre quais dados estão sendo coletados e com que finalidade. Quando desligamentos ocorrem com base em parâmetros ocultos, não apenas se destrói a confiança: abre-se espaço para disputas judiciais.

Métricas devem ser complementadas por avaliações qualitativas e usadas para desenvolver talentos, não apenas para cortar cabeças. O desligamento, quando inevitável, precisa ser baseado em critérios éticos, conhecidos e defensáveis. Afinal, se a empresa não consegue explicar de forma transparente a razão da demissão, a métrica já nasceu viciada.

O pacto de confiança no trabalho remoto

No fim, a responsabilidade é mútua. Empresas precisam agir com ética e respeitar a dignidade dos trabalhadores, mas os profissionais também devem corresponder com comprometimento e entrega. O trabalho remoto bem-sucedido depende desse pacto de confiança: quando cada lado cumpre sua parte, gera-se um círculo virtuoso de flexibilidade, produtividade e lealdade.

A pergunta que cada líder precisa se fazer é simples: “Eu realmente preciso espionar meu funcionário para que ele trabalhe?”. Se a resposta for “sim”, talvez o problema não esteja no funcionário, mas na gestão ou no modelo de contratação.

Em última análise, gente não é número. Métricas são ferramentas poderosas, mas perigosas se mal utilizadas. Servem para orientar e reconhecer, não para punir indiscriminadamente. A lição é clara: empresas que buscam eficiência sem atropelar a ética constroem relações de trabalho mais sólidas, e são justamente essas que prosperam de forma sustentável.

*Adriana Melo é CFO da SAS Brasil, com mais de 20 anos de experiência em finanças corporativas, planejamento, controladoria e uma especialização estratégica em tributação. Já passou por empresas como Votorantim, Ferrero e Gartner.


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