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Seguro Garantia. Novas Regras

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Voltaire Marensi - Advogado e Professor Voltaire Marensi - Advogado e Professor

Publicada em 12 de abril de 2022, a Circular Susep, de 11 de abril de 2022, dispõe sobre novas regras do Seguro Garantia.

Essa Circular é composta de 38 artigos que no teor desse normativo entrará em vigor em 2 de maio de 2022.

A Circular inicia definindo como modalidade desse tipo securitário, o conjunto de cláusulas que estabelecem as disposições específicas do Seguro Garantia composto de características, dispositivos e legislação correlata da obrigação garantida.

O objeto principal seriam relações jurídicas imbricadas em contratos inerentes a feitos editalício, processual ou de qualquer outra natureza, decorrentes de obrigações e direitos entre segurado e tomador, independentemente da denominação utilizada.

A meu sentir, já no dispositivo acima inserto há uma repetição de formas, de vez que o meio editalício se insere no conteúdo lato senso, de um contexto processual.

Nessa toada, Araken de Assis, diz cuidar-se, “na verdade, de um mal necessário, pois a sua exclusão em termos categóricos tornaria estéril o direito fundamental de acesso à Justiça”. (Processo Civil Brasileiro, volume II – Tomo I. Revista dos Tribunais, 2ª tiragem, 2015, página 1552).

Na obrigação garantida assume o tomador junto ao segurado o objeto principal com a garantia prevista na apólice de seguro.

O segurado, de fato, é o credor das obrigações assumidas pelo tomador no objeto principal segurado.

Pois bem. O Seguro Garantia tem por escopo garantir o fiel cumprimento das obrigações garantidas.

No setor público, diz a Circular, que a garantia tem por objeto principal as regras sujeitas ao regime jurídico à área pertinente, assim como na garantia concernente ao direito privado quando dela se tratar.

Trata, em seguida, de se definir o sinistro como a inadimplência do tomador à obrigação garantida.

Também a Circular identifica a definição de tomador que é o devedor das obrigações estabelecidas no objeto principal perante o segurado, sendo o valor da garantia o máximo acobertado pela apólice de seguro.

Outro ponto relevante a ser destacado nos artigos dessa Circular, diz que se o objeto principal for um processo – judicial -, o juiz poderá agir em nome do segurado na apólice, (sic), de acordo e nos limites da legislação específica do objeto principal.

O juízo, rectius, o juiz do processo, poderá agir em nome do segurado, como no-lo diz a Circular? Creio que não. O juiz não age de ofício, vale dizer, ne procedat judex ex officio.

Embora o interesse do Estado busque a verdade real a jurisdição é inerte e como tal não pode o juiz agir em nome do segurado, data vênia.

O objetivo do Seguro Garantia está estampado no artigo 3º da Circular, quando se enfatiza que ele se destina a garantir o objeto principal contra o risco de inadimplemento pelo tomador das obrigações garantidas.

Um outro dispositivo que merece ser pinçado e, aqui, positivamente, o faço de maneira a ser aplaudida por todos nós, diz em relação a hipótese de o Seguro Garantia não garantir todas as obrigações do objeto principal, já que a apólice deverá destacar esta informação, além de descrever, de forma clara e objetiva as exatas obrigações garantidas. (Parágrafo único do art. 5º).

No prazo de vigência da apólice essa deverá ser igual ao decurso do tempo da obrigação garantida. Caso seja inferior à vigência da obrigação garantida, a seguradora deve assegurar a manutenção da cobertura, enquanto houver risco a ser acobertado. Para isso, a seguradora deverá especificar os critérios para manutenção da cobertura e/ou da renovação da apólice, não podendo gerar prejuízo à manutenção da cobertura e aos direitos do segurado, assegurando que tanto os procedimentos de cobertura como de renovação, ocorram antes do término de vigência da apólice. A comunicação ao segurado e ao tomador deverá ser feita pela seguradora com antecedência mínima de noventa dias. Nada mais justo e, automaticamente, razoável o prazo estabelecido pelo normativo regulamentador.

Quanto a alteração e atualização da apólice há de ser efetivada em perfeita sintonia com as partes contratantes, a fim de evitar agravamento do risco, ou até mesmo, má-fé do segurado.

Também o índice e a periodicidade de atualização dos valores da apólice, quando aplicáveis serão os mesmos definidos no objeto principal, ou plasmados na respectiva legislação de regência.

A forma de contratação do seguro garantia – diz o artigo 13º-, é efetivada a risco absoluto, vale dizer, situação na qual a seguradora responde integralmente pelo valor do sinistro, limitado o valor de garantia, não se aplicando, em qualquer situação, cláusula de rateio. A meu juízo, excelente posição normativa e bem gizado o desenho do significado de risco absoluto.

Quanto aos beneficiários da apólice, o artigo 15 diz que no caso de eventual inadimplência do tomador em relação à obrigação garantida gerarem prejuízo a terceiros estes poderão, a meu sentir, - facultativamente -, ser incluídos na apólice na condição de beneficiários em sintonia com o objeto principal e/ou legislação específica. Se enfatiza, ademais, que nas condições contratuais do seguro é imperioso descrever claramente a possibilidade de inclusão de beneficiários, bem como sua definição e relação com a obrigação garantida.

Quanto ao pagamento do prêmio é dito que o tomador é o responsável pelo pagamento do prêmio do seguro.

Um outro destaque importante que impende sublinhar, inserto neste normativo, se acha relacionado nos termos exarados pelo § 1º, do artigo 16, no sentido de que “a apólice continuará em vigor mesmo quando o tomador não houver pago o prêmio nas datas convencionadas” (sic).

Essa é uma determinação que se orienta no enunciado 616 do STJ, que diz: “A indenização securitária é devida quando ausente a comunicação prévia do segurado acerca do atraso no pagamento do prêmio, por constituir requisito essencial para a suspensão ou resolução do contrato de seguro”.

Na Circular em comento, o órgão normativo foi além do que está expresso no enunciado sumular supra indicado, pois sequer advertiu que a seguradora deveria fazer uma comunicação prévia ao segurado em relação ao seu atraso no pagamento do prêmio, uma vez que a apólice do Seguro Garantia continuará em vigor, malgrado o inadimplemento do tomador do seguro.

Data vênia, tanto a súmula do STJ que já comentei algures, assim com própria Circular prevê, extrapolam, a meu juízo, o limite do razoável. Explico melhor, formulando a seguinte pergunta: a indenização securitária será devida, mesmo sem pagamento do prêmio? A propósito, leiam estimadas leitoras e caros leitores o que comentei em artigo publicado na Revista dos Tribunais, RT nº 551, página 286. Setembro/81, ou seja, qualquer indenização decorrente de contrato de seguros dependerá da prova de pagamento do prêmio devido antes da ocorrência do sinistro. Tal conclusão se infere no disposto na norma de maior hierarquia legislativa, vale dizer, § único, do artigo 12 do Decreto-lei número 73/66, ainda vigente, embora com todas suas posteriores alterações.

Há na Circular, especificamente em seu artigo 17, a definição de expectativa de sinistro como o fato ou ato que indique a possibilidade de caracterização do sinistro e o início da realização de trâmites e/ou verificação de critérios para comprovação da inadimplência, aonde se lê que essa definição se encontra acrisolada no § 1º do artigo 18. Isso ocorre, segundo o caput desse dispositivo quando ocorrer o sinistro caracterizado pela inadimplência do tomador em relação à obrigação garantida. Ademais, minudencia o sobredito parágrafo, pode acontecer de maneira imediata, caracterizando como data do sinistro a inadimplência do tomador. Venia concessa, pelas razões acima tecidas discordo do que está dito nessa passagem tipificada como sinistro, pois a falta de pagamento do prêmio nunca se constituiu sinistro.

“O prêmio, doutrina Pedro Alvim, é o quarto e último dos elementos essenciais do contrato de seguro. Pelo fato mesmo de participarem da essência do contrato, sem esses elementos não existe seguro. A falta de qualquer deles desfigura o contrato”. (O Contrato de Seguro. Forense. 1ª Edição, Rio de Janeiro 1983, página 269).

A indenização do Seguro Garantia se encontra prevista no artigo 21 da Circular. “No Direito do Seguro este princípio, adverte Maurício Gravina, é também chamado de princípio indenitário. Tem o sentido de que no seguro de danos a indenização não pode ser objeto de enriquecimento ou especulação”. (Princípios Jurídicos do Contrato de Seguro. 2ª Edição. Escola Nacional de Seguros, março de 2018, página 81).

Pois bem. A Circular em comento prevê que a seguradora indenizará o segurado ou beneficiário com pagamento em dinheiro dos prejuízos e respectivos acessórios; da execução da obrigação garantida de forma a dar continuidade nos moldes estabelecidos no objeto principal, ou conforme o que foi acordado entre segurado e seguradora. (Incisos I e II do seu artigo 21).

A Circular também alvitra a concorrência de apólices vedando a utilização de mais de um Seguro Garantia, salvo no caso de apólices complementares. Neste ponto, estou em total sintonia com o que se acha previsto na lei ordinária de hierarquia superior ao poder regulamentar como ressalto também no parágrafo infra.

Pois, segundo o artigo 781 do nosso Código Civil “a indenização não pode ultrapassar o valor do interesse segurado no momento do sinistro, e, em hipótese alguma, o limite máximo da garantia fixado na apólice, salvo em caso de mora do segurador”.

Adverti na ocasião que essa regra material de que “o princípio de um outro seguro sobre a mesma coisa também está previsto neste Código, - referia-me ao Código Civil atual -, mas, com a restrição de que o segurador primitivo deve ser comunicado por escrito, além de receber a indicação da quantia segurada. O objetivo do legislador é proteger o interesse segurado que, em última ratio, não pode ultrapassar o valor do bem”. (O Contrato de Seguro à Luz do Novo Código Civil, 3ª edição. Thomson/IOB, 2005, página 50).

A Circular aborda sob a rubrica de Riscos Excluídos a inadimplência de obrigações garantidas de atos ou fatos de responsabilidade do segurado que contribuiu para ocorrência do sinistro, ou a inadimplência de obrigações do objeto principal que não sejam de responsabilidade do tomador.

E mais, explicita a Circular: “atos exclusivos do tomador da seguradora ou de ambos não poderão gerar perdas ou prejuízos ao segurado”, numa clara demonstração de que o beneficiário dessa modalidade contratual não poderá ser penalizado, já que se trata de um terceiro interessado, mas, que, jamais contribuiu para o sinistro. (Grifo meu).

Cuida-se de um princípio da relatividade dos contratos que se estriba em um adágio multissecular que se aplica à espécie, isto é, um ato cognominado res inter alios neque nocet neque prodest, em tradução livre, coisa efetivada entre as partes não pode prejudicar terceiros.

De outro giro, no artigo 26 da Circular fala-se, casuisticamente, das situações decorrentes da extinção da apólice.

Nas modalidades decorrentes do Seguro Garantia o que deve ser salientado, a meu sentir, é o que está vazado no parágrafo único do artigo 27, ou seja, de que a responsabilidade da seguradora deve estar adstrita com as características e a legislação específica do objeto principal e da obrigação garantida tudo de acordo com o modelo clausulado exigido pelo segurado.

Ainda está previsto na Circular uma “Política de Subscrição e Mitigação do Risco” convidando que todos os envolvidos nessa modalidade negocial colaborem para o perfeito cumprimento de todas as obrigações.

“La obligación de comportarse com correción y buena fe, deriva del espíritu de colaboración que debe informar cualquier ordenamento jurídico moderno, já ensinava o Prof. Alberto Trabucchi, Catedrático de Derecho Civil de la Universidad de Pavía, uma comuna na Itália. Versão espanhola. (Instituciones de Derecho Civil, volume II. Editorial Revista de Derecho Privado. Madrid, 1967, página 26).

Inseridos nesses ensinamentos ele também se encontra jungido ao próprio interesse no contrato de seguro, aliás, já assinalado em um distinto viés hauridos nos ensinamentos de outro grande jurisperito A. Von Tuhr, citado, ao azo, com bastante frequência, pelo nosso imorredouro mestre Pontes de Miranda, verbis;

“Para que los interesses puedan nascer e incrementarse, es menester que exista un crédito principal”. (Tratado de Las Obligaciones. Traducido del alemán por W. Roces. Tomo I. Madrid. Editorial Reus. S.A. 1934, página 49).

É o caso dessa modalidade securitária e de tantas outras existentes no mundo relacional.

Nos Aspectos Gerais dessa Circular está bem tipificada essas características inexas no perfil e até no risco de inadimplência do Seguro Garantia.

Detalha-se, outrossim, o contrato de contragarantia que é aquele relativo às obrigações estabelecidas entre seguradora e tomador, que quando houver, não poderá interferir no direito do segurado.

Cabe, por fim, assinalar que nas Disposições Finais se insere um parágrafo único ao artigo 34, que assinala que nos contratos de Seguro Garantia para cobertura de grandes riscos, se aplicam os artigos 2º e 3º da Circular sendo facultativa a adoção de suas demais disposições.

Somente a partir de 1º de janeiro de 2023, as seguradoras serão proibidas de comercializar novos contratos de Seguro Garantia em desacordo com os moldes estabelecidos na Circular objeto destes comentários.

Revogam-se, ainda, duas Circulares Susep, as de números 477 e 577, respectivamente, de 2013 e de 2018.

Não tive, aqui, a pretensão de abordar analiticamente a Circular em tela, fazendo a exegese de artigo por artigo. Todavia, penso ter trazido minha modesta contribuição para no decurso de cada dia aperfeiçoarmos nossa legislação securitária.

É o que penso, sob censura dos doutos.

Porto Alegre, 15/04/2022

Voltaire Marensi - Advogado e Professor


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