Seguro para Motoristas de Aplicativos (Destaque)
Lendo o Informativo Migalhas, hoje, 02/10/2025, que estampou o início do julgamento da Reclamação 64018 perante o Supremo Tribunal Federal, deparei-me com a seguinte observação durante a sessão de ontem naquela Corte, verbis:
“O ministro Luís Roberto Barroso destacou pontos levantados por motoristas de aplicativos a respeito das condições de trabalho na economia de plataformas.
O julgamento trata do enquadramento de modelos contratuais fora da CLT e tem grande impacto sobre o setor digital.
Barroso relatou que, em encontro recente com representantes da categoria, três preocupações se mostraram centrais: definição decritérios para jornada de trabalho, garantia de remuneração mínima e funcionamento adequado do seguro previsto em lei.
Segundo ele, a maior queixa foi de que o seguro, embora exista formalmente, não cobre adequadamente períodos em que o trabalhador fica impossibilitado de exercer sua atividade por acidente.
O ministro também registrou que os motoristas manifestaram inquietação quanto à previdência social. Ressaltou que como não há empregador que recolha contribuições e muitos profissionais autônomos não conseguem arcar com o pagamento por conta própria, há risco de desproteção previdenciária”[1].
Aproveito a oportunidade neste ensaio para fazer um breve registro, quanto ao seguro privado.
O seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, tradicionalmente denominado DPVAT, constituía um instrumento jurídico de relevante função social, ao assegurar indenização mínima às vítimas de acidentes de trânsito, abrangendo motoristas, passageiros e pedestres.
Porém, desde 2021 houve a suspensão da cobrança, em razão da suficiência de recursos acumulados, o que gerou acentuada insegurança jurídica quanto à continuidade da cobertura.
No ano de 2023, o legislador sancionou a Lei nº 14.599/2023, que instituiu o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), restabelecendo o caráter compulsório do instituto, com previsão de retomada de sua cobrança a partir do exercício de 2025.
Todavia essa modalidade securitária não foi adiante.
Nesse contexto fático, coloca-se em análise a situação dos motoristas de aplicativos, categoria que tem adquirido crescente relevância econômica e social no Brasil, sobretudo em função de sua inserção precária nas redes de proteção securitária e previdenciária.
O DPVAT foi criado pela Lei nº 6.194/1974, com caráter público e de cobertura universal, tendo como objetivo principal garantir indenizações em casos em casos de morte, invalidez permanente, total ou parcial, além de despesas médicas e suplementares.
Com a edição da Lei nº 14.599/2023, o DPVAT seria substituído pelo SPVAT, preservando-se a natureza obrigatória do seguro, que seria conduzido através de uma gestão centralizada da Caixa Econômica Federal, responsável pela arrecadação e pagamento das indenizações.
Os motoristas de aplicativos, embora não contemplados naquela lei específica teriam, sem dúvida alguma, sua inclusãona condição de condutores/proprietários de veículos automotores, sujeitando-se às mesmas obrigações impostas aos demais motoristas.
A atuação profissional dos motoristas de aplicativo intensifica o risco de acidentes, dada a maior exposição ao trânsito urbano merecendo, de modo isonômico, a mesma proteção em relação a qualquer condutor de veículo automotor.
Alguns pontos ainda demandam nos dias atuais definição normativa e debate doutrinário, que deveriam ser considerados. Um deles, diz respeito ao valor do prêmio, posto que até o presente momento não há qualquer definição normativa quanto ao montante da contribuição, quer por parte da empresa de plataforma, quer por parte dos profissionais desta área.
Outros pontos, que penso ser considerados diria respeito à distribuição do custo no caso de eventual debate sobre o repasse integral ou não ao motorista com a possibilidade de se aventar uma espécie de cofinanciamento por parte das respectivas plataformas.
A par da modalidade do seguro obrigatório para outras modalidades securitárias ainda previstas no Decreto-Lei nº 73/66, penso que a exemplo de qualquer veículo automotor também a plataforma destes aplicativos deveriam tratar junto com seus credenciados a inclusão do seguro de responsabilidade civil facultativo que tem um custo operacional bastantepequeno. Por que não?
Há países com a nossa vizinha Argentina em que os seguros obrigatórios já estão acoplados ao seguro de responsabilidade civil, (popularmente conhecidos como seguro contra terceiros).
Já no Chile, embora a responsabilidade civil “contra terceiros” seja facultativa ela é normalmente vendida como extensão do seguro obrigatório.
No México desde 2019 passou a ser obrigatório o seguro de responsabilidade civil para veículos em rodovias federais. Da mesma sorte no Uruguai.
Assim, em síntese, Argentina, Uruguai e México permitem complementar o seguro obrigatório com o seguro de responsabilidade civil facultativa.
O retorno do seguro obrigatório, agora sob a forma do SPVAT, reafirmaria, se se levasse adiante, o compromisso do ordenamento jurídico brasileiro com a proteção mínima das vítimas de acidentes de trânsito, mantendo sua vocação de instrumento de justiça distributiva e solidariedade social.
No tocante propriamente aos motoristas de aplicativos, não há sequer previsão legal que lhes confira tratamento diferenciado. Porém, não há dúvida que eles devem ser considerados condutores de veículos automotores e, portanto, obrigados à contribuição e beneficiários da cobertura securitária.
A discussão contemporânea desloca-se, portanto, para a responsabilidade compartilhada entre Estado, plataformas digitais e motoristas, a fim de garantir não apenas a proteção mínima legal, mas também condições justas de trabalho e de repartição do risco social inerente à atividade de transporte remunerado de passageiros.
É o que se espera no deslinde desta questão perante o órgão máximo do Poder Judiciário que, atualmente, com seu ativismo deve procurar também trazer segurança a toda nossa população, queraosseus motoristas, quer aos que estão sujeitos aos acidentes que vitimam também muitos pedestres em um trânsito caótico, notadamente em grandes metrópoles.
É o que penso.
Porto Alegre, 02/10/2025
Voltaire Marenzi - Advogado e Professor
[1]https://www.migalhas.com.br/quentes/441329/barroso-diz-que-conversou-com-motoristas-e-conta-queixas-da-categoria
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