Em Despesas Condominiais o Credor Fiduciário Deve Integrar a Execução (Destaque)
- Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por Voltaire Marenzi - Advogado e Professor
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O Superior Tribunal de Justiça, em decisão assinada eletronicamente, em data de 27/10/2025, através de seu relator ministro Paulo Dias de Moura Ribeiro, integrante da Terceira Turma, julgou o recurso especial sob número 2.2237.090-SP, no qual constou a seguinte ementa:
“CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
COBRANÇA DE DESPESAS CONDOMINIAIS. PENHORA DE IMÓVEL COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. CREDOR FIDUCIÁRIO QUE NÃO INTEGRA A EXECUÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO”.
- Recurso especial interposto contra decisão que negou a penhora de
imóvel gravado com cláusula de alienação fiduciária para pagamento de taxas condominiais.
- Nos termos do recente posicionamento da Segunda Seção desta Corte, por maioria de votos, somente é possível a penhora de bem alienado fiduciariamente, ainda que para a satisfação de taxas condominiais dele decorrentes, quando o credor fiduciário for citado para integrar a execução”. Grifos meu.
Como salientado no bojo do voto do ministro relator este posicionamento foi recentemente adotado pelo Tribunal da Cidadania através de sua Segunda Seção, que engloba a Terceira e a Quarta Turma, respectivamente, pertinente ao órgão fracionário que julga, em sede infraconstitucional, matéria correlata a direito privado dando sua última palavra sobre o tema supra referenciado.
Impende sublinhar, que a 2ªSeção chegou a esse posicionamento, por maioria de seus componentes.
Vale ressaltar que no caso em tela, em sede de execução, a penhora teria recaído sobre os direitos aquisitivos que a devedora fiduciante possuía sobre o imóvel.
O exequente, um condomínio edilício, se mostrou inconformado com a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, que, acertadamente, julgou que um imóvel objeto de contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária, seria passível de penhora por dívida condominial, inobstante ser gravado com alienação fiduciária desde que citado o respectivo credor fiduciário.
Neste pensar, em seu voto, o ilustrado ministro relator expôs ser possível que a penhora de imóvel gravado com alienação fiduciária, ainda que para a satisfação de taxas condominiais dele decorrentes, exigiria que o credor fiduciário fosse citado para integrar a execução.
Para robustecer essa asserção, valeu-se de precedente, assim ementado:
“CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES CONDOMINIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. NATUREZA PROPTER REM DO CRÉDITO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. PENHORA DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE.
RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. (Sic).
- Em execução por dívida condominial movida pelo condomínio edilício
o imóvel alienado fiduciariamente, é passível de penhora uma vez que o próprio imóvel que dá origem ao crédito condominial, de natureza propter rem da dívida, é previsto nos termos do artigo 1.345 do Código Civil de 2002.
- A natureza propter rem se vincula diretamente ao direito de propriedade sobre a coisa. Por isso, sobreleva-se ao direito de qualquer proprietário, inclusive do credor fiduciário, pois este, na condição de proprietário sujeito a uma condição resolutiva, não pode ser detentor de mais direitos que um proprietário pleno.
- Assim, o condomínio exequente deve promover também a citação do credor fiduciário, além do devedor fiduciante, a fim de vir aquele integrar a execução para que se possa encontrar a adequada solução para o resgate dos créditos condominiais, por ser, afinal, sempre do proprietário o dever de quitar o débito para com o condomínio, sob pena de ter o imóvel penhorado e levado a praceamento. Ao optar pela quitação da dívida, o credor fiduciário sub-roga-se nos direitos do exequente e tem regresso contra o condômino executado, o devedor fiduciante.
- As normas dos artigos 27, § 8º, da Lei 9.514/1997 e 1.368-B, parágrafo único, do Código Civil de 2002, reguladoras do contrato de alienação fiduciária de coisa imóvel, apenas disciplinam as relações jurídicas entre os respectivos contratantes, sem alcançar relações jurídicas diversas daquelas, nem se sobrepor a direitos de terceiros não contratantes, como é o caso da relação jurídica entre condomínio edilício e condôminos e do direito do condomínio credor de dívida condominial, a qual mantém sua natureza jurídica propter rem.
- Descabe isentar-se de suas inerentes obrigações o condômino credor fiduciário para, na prática, colocar sobre os ombros de terceiros, os demais condôminos alheios à contratação fiduciária, o ônus de suportar as despesas condominiais tocantes ao imóvel alienado fiduciariamente, quando o devedor fiduciante descumpre essa obrigação legal e contratual assumida perante o credor fiduciário.
O acertamento, em tal contexto, como é mais justo e lógico, deve-se dar entre os contratantes: devedor fiduciante e credor fiduciário.
- Recurso especial improvido.
(REsp n. 1.929.926/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Relator para acórdão Ministro Raul Araújo, Segunda Seção, julgado em12/3/2025, DJEN de 27/5/2025)”.
Deste modo, o entendimento adotado pela Corte paulista teria observado o posicionamento da Segunda Seção de Direito Privado do STJ, não havendo motivos para sua alteração.
Pois bem. Ademais, calha à fiveleta nesta assentada que se faça uma análise de duas situações registradas no voto em foco.
A primeira delas diz respeito ao conceito e a natureza jurídica de uma obrigação propter rem partindo da responsabilidade e da legitimidade das partes em execução de cotas condominiais de unidade submetida à alienação fiduciária em garantia, com enfoque sobre esta natureza jurídica, da necessidade de citação do credor fiduciário e, por último da sub-rogação do credor fiduciário, especialmente à luz da Lei nº 15.040/2024 (Novo Marco Legal dos Seguros).
O artigo 1.345 do Código Civil atribui ao adquirente de unidade condominial a responsabilidade por débitos do alienante, configurando obrigação propter rem, isto é, aquela que acompanha o bem, independentemente de quem seja o proprietário.
O fundamento é o ônus inerente à fruição da coisa comum, e não um vínculo contratual entre condomínio e condômino.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça mantém entendimento estável, ao assim decidir em outros precedentes.
“As despesas condominiais possuem natureza de obrigação propter rem, razão pela qual a responsabilidade pelo seu pagamento decorre da titularidade da unidade autônoma.” (STJ, REsp 1.345.331/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão,4ª Turma, DJe 17/04/2015.)
De outro giro, nos termos da Lei nº 9.514/1997, o contrato de alienação fiduciária transfere ao credor a propriedade resolúvel do imóvel, mantendo o devedor fiduciante na posse direta e uso do bem.
Consequentemente, as cotas condominiais incumbem ao fiduciante, que exerce o poder de fato sobre o bem, respondendo pelas obrigações propter rem até a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário.
“O devedor fiduciante, que detém a posse direta do imóvel, é o responsável pelo pagamento das cotas condominiais até a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário.” (STJ, AgInt no REsp 1.863.163/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, DJe 23/11/2020).
Como se disse supra o entendimento exarado nesta recente decisão, desprezou as duas hipóteses que o Tribunal vinha trilhando, vale dizer, a execução apenas contra o fiduciante (sem constrição do bem), ou seja a de que o credor fiduciário não precisava ser citado, por não ser parte na relação obrigacional propter rem, ou a execução com pedido de penhora ou adjudicação do imóvel, tal qual se decidiu no vertente caso, isto é, a citação do credor fiduciário é imperiosa e necessária para resguardar sua propriedade resolúvel e o direito de preferência sobre o produto da alienação.
Confira-se também:
Por todas, a citação do credor fiduciário é indispensável na execução de cotas condominiais quando se objetiva a penhora do imóvel, pois ele detém a propriedade resolúvel do bem.
De outra banda, o artigo 346, III, do Código Civil autoriza a sub-rogação de quem, “não sendo devedor, paga dívida pela qual tinha interesse em não ser desapossado”.
O credor fiduciário, ao satisfazer as cotas condominiais para evitar a consolidação de ônus sobre o imóvel, sub-roga-se nos direitos do condomínio, podendo exigir reembolso do fiduciante.
Pois bem. O credor fiduciário que paga as despesas condominiais para preservar o bem dado em garantia sub-roga-se nos direitos do condomínio.
Por fim, em relação a Lei nº 15.040/2024, em vigor a partir de 11 de dezembro de 2025, que irá sistematizar e modernizar o regime jurídico dos contratos de seguro no Brasil, destaca o regramento expresso da sub-rogação securitária e sua articulação com os direitos civis e reais.
O artigo94 da Lei 15.040/2024 dispõe:
“A seguradora sub-roga-se nos direitos do segurado pelas indenizações pagas nos seguros de dano”.
Esse dispositivo atualiza e amplia o conteúdo inserto no Código Civil, consolidando o princípio de que a sub-rogação do segurador opera de pleno direito.
Vale sublinhar o que escrevi publicado na Revista dos Tribunais, em comemoração aos seus 100 anos:
“Há necessidade de prova efetiva do pagamento da indenização ao segurado, embora os efeitos da sub-rogação não necessitem de maiores formalidades legais.
Nesse diapasão, Maurice Picard e André Besson, em sua obra Les Assurances Terrestres em Droit Français (1975, página 505), registraram: “La condition essentielle de lasubrogation est lepaiment de l’indemnité, carce paiment em est le fait générateur.
Em seguida, eles acentuam: Em revanche, l’absense de preuvedupaimentrendinecevable tout action de l’assureurcontreletiers”.[1]
Por outro lado, quando o condomínio é beneficiário de seguro de inadimplência condominial, e a seguradora indeniza as cotas não pagas, esta sub-roga-se contra o condômino inadimplente, que é o fiduciante.
A sub-rogação, enfim, abrange todos os direitos do condomínio, inclusive privilégios e garantias reais, dentro do limite da indenização paga.
Destarte, o Marco Legal dos Seguros reforça esse efeito ao dispor, em seu artigo94, §1º:
“É ineficaz qualquer ato do segurado que diminua ou extinga a sub-rogação”.
Portanto, a seguradora passa a ocupar a posição do condomínio em relação ao crédito, sem desnaturar o caráter propter rem da obrigação.
Se tanto o credor fiduciário quanto a seguradora realizarem pagamento de cotas condominiais (por motivos distintos), ambos se sub-rogam contra o fiduciante.
Corroborando nesta direção o nosso direito material afirma que “a sub-rogação transfere ao novo credor todos os direitos, ações, privilégios e garantias do primitivo, em relação à dívida, contra o devedor principal e os fiadores”.[2]
Com o adventoda LCSse reforça que a sub-rogação se limita ao valor efetivamente pago, e de que não cria solidariedade entre sub-rogados, além de não alterar o regime real da obrigação, permanecendo essa vinculada à coisa (propter rem).
Finalizando, em sede de conclusão, este ensaio se poderá afirmar que as obrigações condominiais mantêm natureza propter rem, vinculando o possuidor direto ou o titular do direito real.
O devedor fiduciante é o responsável direto pelas cotas, enquanto detiver a posse do imóvel.
O credor fiduciário só deve ser citado quando houver pretensão de constrição do bem; fora disso, a meu sentir, sua intervenção é facultativa.
Todavia, o credor fiduciário que pagar as despesas condominiais sub-roga-se nos direitos do condomínio contra o fiduciante.
Neste norte, a seguradora ao indenizar o condomínio por cotas inadimplidas, sub-roga-se de pleno direito (Lei 15.040/2024, artigo 94), contra o condômino inadimplente.
A Lei nº 15.040/2024 reforça o caráter automático, limitado e não prejudicial da sub-rogação do segurador, garantindo harmonia com o nosso Código Civile com o princípio da natureza jurídica da obrigação propter rem.
Eventuais sub-rogações concorrentes (fiduciária e securitária) coexistem e se ordenam conforme o momento e o valor do pagamento, respeitando-se a natureza real e a função garantidora da obrigação.
Por derradeiro, à luz da legislação civil, processual e securitária vigente — especialmente da LCS —, conclui-se pela compatibilidade entre o regime das obrigações propter rem, a alienação fiduciária e a sub-rogação securitária, reafirmando-se a necessidade de citação do credor fiduciário na execução de cotas com plena valia das sub-rogações subsequentes, observados sempre os limites legais.
É o que penso, s.m.j.
Porto Alegre, 11 de novembro de 2025
Voltaire Marenzi - Advogado e Professor
[1] Voltaire Marenzi. Análise da Nova Lei de seguros. Roncarati Editora, 2025, página 135.
[2] Artigo 349 do nosso atual Código Civil.
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