Do Seguro de Responsabilidade Civil na Lei 15.040 de 2024 (Destaque)
- Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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O Seguro de Responsabilidade Civil na Nova Lei Securitária (Lei nº 15.040/2024), que passará a viger a partir de 11 de dezembro do corrente ano, em razão da vacatio legis determinada em seu último artigo, cuida do Seguro de Responsabilidade Civil, em seus artigos 98 a 107.
Sobre esta modalidade securitária ocupei-me em meu livro, às páginas 141 a 153.[1]
O seguro de responsabilidade civil ocupa posição de relevo no sistema jurídico contemporâneo, ao combinar a função reparatória do direito civil com a função social do contrato de seguro. No Brasil, esse instituto sempre encontrou fundamentos dispersos, no Código Civil como em normas infralegais expedidas pela Superintendência de Seguros Privados, SUSEP.
Deveras. Coma promulgação da Lei nº 15.040, de 11 de dezembro de 2024, conhecida como Marco Legal dos Seguros Privados, se inaugura um novo regime jurídico, dotando o seguro de responsabilidade civil de estrutura normativa mais coerente, moderna e adaptada às transformações econômicas e tecnológicas do mercado.
O seguro de responsabilidade civil, previsto no artigo 787 do Código Civil, é aquele pelo qual o segurador se obriga a garantir o pagamento das indenizações devidas pelo segurado a terceiros, em virtude de danos causados durante a vigência da apólice. Porém, a partir da Lei nº 15.040/2024, essa conceituação é preservada, porém largamente ampliada tanto quanto ao regime jurídico e à autonomia contratual das partes.
Ademais, a matéria em pauta inserta no atual Código Civil é tratada em um único dispositivo, vale dizer, no artigo supra mencionado do atual Código Civil, cujo Capítulo XV – DO SEGURO - será totalmente revogado com a vigência da nova lei[2].
A nova lei reconhece, em seus artigos 98 a 107 o seguro de responsabilidade civil como espécie de contrato com função de transferência e cobertura de risco de terceiros, admitindo a cobertura de danos patrimoniais e extrapatrimoniais (inclusive morais e estéticos); a liberdade de contratação entre segurador e segurado, dentro dos limites do interesse legítimo e da boa-fé; a possibilidade de ocorrência ou reclamação como gatilho de cobertura, a depender da forma pactuada, bem como a ação dos prejudicados contra a seguradora, desde que em litisconsórcio passivo com o segurado, hipótese dispensada quando este não tiver domicílio no Brasil[3].
O principal avanço normativo consiste na consolidação de princípios próprios do contrato de seguro, como a transparência, a cooperação e a equivalência material das prestações, que substituem o antigo modelo de conteúdo pobre, somente plasmado em um dispositivo, além de carente de maiores esclarecimentos em relação ao tema em foco.
Em especial no âmbito da responsabilidade civil, o artigo 98 da Lei nº 15.040/2024 estabelece que o segurador irá garantir o interesse segurado contra os efeitos da imputação e do seu reconhecimento, assim como o dos terceiros prejudicados à indenização.
Neste pensar, o legislador previu que o segurador poderá afastar a imputação de responsabilidade e do seu reconhecimento na defesa do seu segurado em demandas judiciais, com garantia de gastos com a defesa contra a imputação de responsabilidade, desde que estabelecido um limite específico e diverso daquele destinado à indenização dos prejudicados[4].
Além disso, a lei introduz disciplina mais precisa sobre o momento de ocorrência do sinistro, que pode se caracterizar pela ocorrência do fato gerador, de manifestação danosa ou da imputação de responsabilidade.[5]
De fato, como discorreu o jurista italiano Antigono Donati, “perchèla possibilitàdel suo verificarsi constituíscarischio, l’evento deve dunque presentare una sola caratteristica: esse resuscettibile di provocare undanno[6].
Porém, situação diversa ocorre, por exemplo, no caso de um seguro claimsmade, que se corporifica quando a cobertura é acionada no momento da reclamação do terceiro contra o segurado, e não no momento da ocorrência do fato gerador do dano. Ou seja, a seguradora responde pelas reclamações feitas durante a vigência da apólice, mesmo que o ato ou o erro que originou o dano tenha ocorrido antes –, desde que dentro de um período retroativo acordado.
Embora, não exista na lei uma previsão legal detalhada desta modalidade securitária, posto que oriunda de ordenamentos de tradição anglo-saxônica, ele também é adotado no direito brasileiro.
O claimsmade é o regime típico e praticamente universal do seguro D&O - Directorand Officer sLiability Insurance -, tanto no Brasil quanto nos principais mercados internacionais.
Cuida-se de uma espécie de seguro de responsabilidade civil voltado à proteção do patrimônio pessoal de administradores, diretores e conselheiros contra reclamações de terceiros, inclusive da própria sociedade, por atos de gestão supostamente ilícitos ou culposos.
Via de regra, estas reclamações contra administradores ocorrem meses, ou anos após atos de gestão e sua extensão temporal dos riscos é complexa podendo envolver gestões passadas, tais como mudanças de diretoria, etc.
Deveras. O modelo tradicional base de ocorrência se torna inviável, já que seria impossível dimensionar tecnicamente o risco e calcular o prêmio para um evento que pode ser reclamados décadas depois.
No nosso direito positivo estas apólices são estruturadas com data retroativa, com prazo adicional de denúncia, via de regra, de 12 a 36 meses.
Embora se possa dizer que pela leitura do artigo 100 da nova lei, não se colha tal interpretação literal, o fato é que ao determinar o legislador que “o responsável garantido pelo seguro que não colaborar com a seguradora ou praticar atos em detrimento dela responderá pelos prejuízos a que der causa, cabendo-lhe determinadas providências, fica subsumido que eventos reclamados durante a vigência da apólice, ainda que o ato danoso tenha ocorrido anteriormente, desde que respeitados os períodos de retroatividade e de denúncia pactuados.
Assim posto, a meu sentir, tal previsão, ou melhor, previsibilidade, confere segurança jurídica e atuarial, fatores essenciais à expansão desta modalidade de seguro.
Com a entrada em vigor da lei em 11 de dezembro de 2025, a SUSEP deverá editar atos normativos que ajustem as condições padronizadas de seguros de responsabilidade civil — como o RC Profissional, o RC Ambiental, o RC Operacional e o RC de Administradores e Diretores (D&O).
Essa regulamentação infralegal será determinante para a definição de cláusulas de exclusão, limites de cobertura, obrigações do segurado e procedimentos de liquidação de sinistro, temas ainda em debate técnico entre o regulador e o mercado.
Porém, como disse em meu livro, já registrado neste ensaio, “o dever de informação – cooperação – à seguradora, ou seja, de todas as comunicações recebidas, diz que elas devem ser repassadas para que a garantidora se proteja de futuras reclamações do lesado pelo sinistro”.[7]
Sem pretender esgotar a matéria desenvolvida em 10 (dez) artigos na nova lei, aliás todos por mim comentados, artigo por artigo, em relação ao novo marco legal, concluo ao afirmar que a Nova Lei Securitária representa um marco evolutivo para o seguro de responsabilidade civil, ao conferir-lhe base legal própria, com maior previsibilidade e flexibilidade contratual. O modelo proposto privilegia a autonomia privada, mas sem se afastar dos princípios da boa-fé objetiva e da função social do seguro.
Trata-se de uma legislação que tende a fortalecer a cultura do Seguro de Responsabilidade Civil no Brasil, especialmente em setores profissionais e empresariais de alto risco, aproximando o país dos padrões internacionais de cobertura de responsabilidade e promovendo maior segurança econômica e jurídica para segurados, seguradores e terceiros lesados.
É o que penso.
Porto Alegre, 06/11/2025.
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
[1] Voltaire Marenzi. Análise da Nova lei de Seguros. Roncarati Editora, 2025.
[2] Artigo 133 da lei 15.040/24.
[3] Artigo 102 e seu respectivo parágrafo único.
[4] §2º do artigo 98 da Nova Lei.
[5] §1º do artigo 98 da Nova Lei.
[6] Minha obra supra citada, página 143.
[7] Obra citada, páginas 145/146.
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