Ludopatia Entra no Radar do RH e Exige Novas Políticas de Saúde Mental nas Empresas
Dependência em jogos online já motiva afastamentos pelo INSS e pode resultar em ações judiciais por dispensa discriminatória, alertam especialistas
A ascensão das apostas esportivas no Brasil trouxe um desafio silencioso, mas crescente, para os departamentos de Recursos Humanos: a ludopatia — ou dependência em jogos. Embora ainda pouco diagnosticada formalmente, a condição já tem provocado afastamentos por saúde mental no ambiente corporativo, e pode gerar impactos legais para as empresas, especialmente no momento da reintegração ou desligamento de colaboradores.
Segundo a advogada Caren Benevento, sócia da Benevento Advocacia e pesquisadora do Grupo de Estudos de Direito do Trabalho e da Seguridade Social do Insper (GETRAB), é comum que os afastamentos relacionados à ludopatia cheguem ao RH com outros CIDs, como depressão (F32), transtorno de ansiedade generalizada (F41.1), transtorno de ajustamento (F43.2) ou até mesmo ideação suicida (R45.81). “Esses transtornos estão diretamente ligados à compulsão por jogos, mas muitas vezes não são reconhecidos como tal nos processos internos da empresa. O resultado é um problema de saúde mental subnotificado — e de difícil gestão”, explica.
Além da questão assistencial, o cenário também acende um alerta jurídico. De acordo com jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), a dispensa de um colaborador após afastamento por transtorno psiquiátrico pode ser presumida como discriminatória, caso não haja documentação que comprove outro motivo legítimo. Nesses casos, a empresa pode ser obrigada a reintegrar o colaborador, pagar indenização por danos morais e arcar com outras consequências legais.
“Essa é uma situação que muitos RHs ainda não sabem como lidar. O colaborador retorna de um afastamento sensível e, por falta de preparo ou critérios claros, acaba sendo desligado sem embasamento técnico. A intenção pode até ser legítima, mas o risco jurídico é altíssimo”, alerta Caren.
Como o RH pode agir preventivamente?
1. Estabelecendo planos de retorno assistido para afastamentos psiquiátricos;
2. Avaliando a possibilidade de readaptação funcional, antes de decidir pelo desligamento;
3. Mantendo documentação objetiva e contínua de desempenho e conduta;
4. Buscando mediação e diálogo estruturado antes de formalizar a ruptura contratual.
Caren destaca ainda a importância de capacitar lideranças e áreas de people care para identificar sinais de compulsão por apostas e acolher os casos com responsabilidade e sigilo. “A dependência em jogos é uma questão de saúde mental — e, como tal, exige uma abordagem humanizada e estratégica. Ignorar esse tema é abrir espaço para conflitos, prejuízos e perdas que vão muito além do jurídico”, conclui.
Sobre Caren Benevento
Advogada com mais de 20 anos de experiência, Caren é especializada em processos judiciais e negociações trabalhistas no setor bancário, além de gerenciamento de passivo judicial. Há 15 anos, assessora empresas em questões consultivas e contenciosas, com foco em relações de trabalho, áreas empresarial, societária e de governança corporativa. Possui certificação pela International Association of Privacy Professionals (CIPM) e auxilia empresas na conformidade com a LGPD. É pesquisadora do Grupo de Estudos do Direito Contemporâneo do Trabalho e da Seguridade Social da Universidade de São Paulo (GETRAB-USP). Também possui especializações em Direito Empresarial pela FGV Direito SP, Proteção de Dados pela FMP, Negociações Empresariais pela FGV Direito SP, e Compliance Trabalhista pela FGV Direito SP, entre outras formações.
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