Empreendedorismo Feminino - Ascensão das mulheres na liderança de startups fomenta a transformação do ecossistema de inovação e mira futuro com equidade de gênero

Aos poucos, o ecossistema de startups avança no cenário de mulheres em posições de liderança. Mas, apesar do contexto promissor, ainda há muitos paradigmas para serem rompidos, fomentando maior representatividade feminina em um segmento historicamente dominado por homens. Uma das maneiras de acelerar esse processo é garantir espaço para iniciativas capazes de dialogar, transformar e inspirar os negócios para que mais mulheres assumam o comando em tecnologia.

Uma das principais aceleradoras do Brasil, a Darwin Startups fomenta uma comunidade de pessoas empreendedoras, mentores e especialistas dedicados a dar suporte para o crescimento de startups e vem inserindo ações voltadas a promover a participação feminina no ecossistema.

Os resultados desse posicionamento começam a aparecer na prática e em forma de números. De acordo com levantamento da Darwin, são 100 startups aceleradas e investidas em seu portfólio. Atualmente, 25% do portfólio ativo possui mulheres no Cap Table (tabela que compõe acionistas e investidores de uma empresa), demonstrando um dado significativo, mas que ainda possui amplo espaço para crescimento.

Neste cenário, 12% delas têm a mulher na posição de CEO. Além disso, as empresas estão distribuídas em diferentes regiões do país, nos estados de São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso e Rio Grande do Sul. Essas startups também são de segmentos distintos como Software, Telecomunicação, Fintech, IA, E-commerce, Lawtech, Big Data & Analytics, Cyber Security e Healthtech. Quando considerado o modelo de negócios das startups lideradas por mulheres no portfólio, 100% delas são B2B.

Segundo Thaís Carneiro, analista de Investimentos e Portfólio na Darwin, as startups lideradas por mulheres também possuem grande impacto econômico, ressaltando sua importância para o ecossistema como um todo. “Uma amostra de 80% das empresas ativas no portfólio da Darwin mostrou que, em conjunto, o faturamento das investidas alcançou R$ 176 milhões no ano passado. Considerando somente as startups com mulheres em posições de liderança, o faturamento dessas empresas chegou a R$ 40 milhões”.

Além de apoiar e acompanhar o desenvolvimento das startups aceleradas, a Darwin também possui ações dentro do próprio negócio para incentivar a presença feminina no ecossistema. Nos últimos três anos a aceleradora fez a abertura de vagas exclusivas para mulheres com o objetivo de alcançar paridade no número de vagas ocupadas por homens e mulheres no time. Hoje, as funcionárias mulheres representam 60% do total de colaboradores da empresa (antes não chegava a 30%).

O que as pesquisas indicam sobre a presença feminina na tecnologia

Diferentes pesquisas e estudos no Brasil e no mundo indicam que há aumento da participação de mulheres no setor de tecnologia. Porém, alcançar equidade de gênero nas organizações ainda é uma tarefa que deve levar anos e depende de estratégias eficazes que ajudem a quebrar as barreiras de gênero e atrair mais talentos femininos para o setor.

Um dos dados mais recentes sobre o tema no país vem do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGEG), que indicou crescimento de 60% no número de mulheres trabalhando com tecnologia entre os anos de 2015 e 2022. Entretanto, o mesmo estudo indica que as mulheres estão à frente de menos de 5% das empresas de tecnologia em atividade no Brasil, enquanto apenas 3% das startups lideradas por mulheres conseguem captar recursos de investimento para o desenvolvimento dos negócios.

O mais recente relatório “Woman in Technology”, publicado em 2021 pela Michael Page, empresa de recrutamento especializado, também aponta que apenas 25% dos cargos nas áreas de tecnologia no país são ocupados por mulheres. E, na América Latina, as mulheres representam menos de 30% dos profissionais em cargos de liderança no segmento. O Brasil está entre os quatro países da região com a maior ausência de mulheres em cargos de liderança em suas empresas: Chile (73%), Argentina (67%), México (65%) e Brasil (60%).

Os números levantados pela pesquisa revelam ainda que somente 26% das empresas da região possuem programas de retenção e atração de talentos femininos. Em contrapartida, um dado positivo é o de ações que vêm sendo adotadas para promover a liderança das mulheres no setor, com destaque para programas de inclusão de mulheres em temas de gestão, negócio e liderança (24%), programas de visibilidade para a conscientização sobre a importância da diversidade e da inclusão (21%), programas de treinamento e mentoria específicos para mulheres dentro da empresa (20%) e programas de liderança feminina (15%).

Em escala mundial, uma pesquisa do Statista — plataforma alemã especializada em coleta e visualização de dados, com 2,1 mil respondentes, buscou identificar a proporção de mulheres líderes em empresas globais de tecnologia entre 2015 e 2023 e que corrobora com o atual cenário. Segundo o levantamento, em 2015, o percentual de mulheres líderes em empresas de tecnologia era de 8%, e, em 2023, atingiu o pico de 14% (mesmo resultado que 2022) — indicando um aumento gradual, mas ainda tímido de mulheres em cargos de líderes no setor.

Mudanças são necessárias também quando a questão são investimentos. O Female Founders Report 2021, realizado em parceria com Distrito, Endeavor e B2Mammy, sobre a representatividade feminina no empreendedorismo brasileiro destaca que apenas 4,7% das startups são fundadas exclusivamente por mulheres. Além disso, 0,04% do total aportado por investidores em startups em 2020 foram destinados para startups fundadas só por mulheres.

O mesmo estudo traz ainda dados da consultoria McKinsey & Company, que revelam que as empresas com maior diversidade de gênero em equipes executivas têm 25% mais chances de lucrar acima da média, número que sobe para 36% quando é contemplada também a diversidade étnica”. Ou seja, mais do que vencer estigmas, a equidade de gênero é uma oportunidade de gerar novos e melhores negócios no Brasil e no mundo.

Letramento é tarefa contínua

O crescimento do número de startups com mulheres na liderança e que participaram das turmas de aceleração da Darwin também está em evidência. Na penúltima turma , das cinco startups investidas ao fim do programa de aceleração, três tinham mulheres como CEOs (Uffa; CredValue; e IAAS).

Fran Louise, analista de Marketing e Branding na Darwin, aponta que também foi criado um Comitê de Ética e, a partir dele, a aceleradora conseguiu promover diversas ações para os colaboradores, incluindo uma roda de conversa sobre masculinidade exclusiva para homens do time. “Ao longo de 2023 fizemos inúmeros letramentos, dentre eles, a conversa sobre o Anti-machismo, tendo como foco os fundadores homens das startups que estão no nosso portfólio”, explica. Todas essas iniciativas são permeadas pelo zelo da empresa à saúde mental dos funcionários e contam com acompanhamento de psicólogo.

“Estamos abrindo caminhos, mas precisamos letrar e conscientizar as startups de que a presença de mulheres no time não só é possível, como necessário. E essa deve ser uma busca constante, porque times mais diversos constroem um olhar mais plural para o negócio, não só como olhar humano, mas também como questão de estratégia”, explica Fran Louise.

Diversidade ainda tem grandes desafios, mas iniciativas estão sendo ampliadas

A cientista social Amanda Teixeira, analista de Projetos na Darwin, aponta que é possível ampliar a presença feminina nas equipes das startups e em cargos-chave primando pela diversidade como um dos critérios na captação de talentos para as oportunidades nas empresas.

“Programas como o BID ao Cubo (de aceleração de startups) são importantes iniciativas que utilizam a diversidade do time como um dos critérios de seleção. Assim, tentamos equilibrar o programa em relação à diversidade não especificamente só com mulheres, mas sim numa diversidade mais ampla, como de pessoas pretas, mulheres, PCD e outros”. Em oito edições do programa foram 125 empresas participantes, 67% delas com mulheres em posições de liderança.

Ainda se tratando de BID ao Cubo, os estados com maior número de mulheres fundadoras de startups participantes do programa são: Ceará e Bahia (9 startups cada), Pernambuco (7), Amazonas (6) e Pará (5). Além do Brasil, startups com lideranças femininas de países como Argentina, Chile, Colômbia e Uruguai também participaram das edições anteriores.

Outro programa que a Darwin operacionaliza é o Black Founders Fund — iniciativa global do Google for Startups para investir em startups fundadas e/ou lideradas por pessoas negras. O objetivo é que a cada nova turma o programa tenha 30% de mulheres negras fundadoras. No portfólio do programa, considerando as startups que passaram pela jornada com a Darwin, temos 18 mulheres, sendo 9 negras e 9 mulheres brancas em cargos de fundadoras e/ou C-Level. “Aumentar o número de mulheres negras fundadoras no portfólio é um grande desafio, mas é fundamental que estejamos atentos às diferenças e dificuldades que este grupo de mulheres passa para construir e se manter no ecossistema”, salienta Amanda.

Para Amanda Teixeira, uma forma de ampliar a presença feminina e a diversidade nas equipes de startups é, de fato, investir nos critérios de seleção mais diversos, além de realizar programas focados na preparação, formação e/ou empoderamento de lideranças femininas.

“Quando não houver ações específicas ou critérios bem definidos, uma forma proativa é trazer questionamentos sobre presença feminina na liderança e na empresa, nos acompanhamentos ou mesmo a partir de letramentos. É necessário ter ações propositivas para que essa evolução aconteça”, afirma.