NR-1: norma reflete mudanças sociais e desafios atuais do trabalho
Por Marcos Loreto, Diretor Médico da Omint Saúde e Cirurgião de Cabeça e Pescoço
Desde 26 de maio, entrou em vigor a nova redação da Norma Regulamentadora nº 01 (NR-01) com uma mudança que marca uma nova era no ambiente corporativo: a inclusão da saúde mental como parte dos riscos ocupacionais que devem ser prevenidos pelas empresas. Com isso, temas como assédio moral, burnout, estresse crônico e sobrecarga de trabalho passam a ter o mesmo peso de riscos físicos, químicos e biológicos no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).
A mudança não vem por acaso, é reflexo de uma transformação social mais profunda, impulsionada pela pandemia de covid-19. O isolamento, as perdas e a insegurança intensificaram quadros de ansiedade, depressão e burnout, e expuseram a necessidade de cuidar não só da saúde física, mas também da saúde emocional. Segundo dados do Ministério da Previdência Social, nos últimos 10 anos, o Brasil registrou um aumento de 68% nos afastamentos do trabalho por questões relacionadas à saúde mental.
Paralelamente, o mundo corporativo sentiu a influência da Geração Z, que ocupou seu espaço no mercado de trabalho trazendo novas expectativas. Marcada pelo isolamento social em plena fase de formação, essa geração desenvolveu uma consciência mais aguçada sobre saúde mental. Hoje, prioriza a qualidade de vida, busca equilíbrio entre vida pessoal e profissional e não tolera ambientes tóxicos.
A atualização da NR-1 oficializa uma mudança cultural para a promoção do bem-estar no ambiente de trabalho. Conforme a norma, além do diagnóstico de riscos psicossociais, as organizações devem adotar políticas como:
Treinamentos para lideranças com foco em escuta ativa e empatia;
Ações que promovam o equilíbrio entre vida pessoal e profissional;
Incentivo à atividade física, técnicas de relaxamento e qualidade do sono;
Apoio psicológico presencial ou online;
Campanhas de conscientização sobre saúde emocional;
Programas de nutrição e bem-estar.
As empresas terão, ao longo deste ano, que se adequar às novas regras, já que a fiscalização começará a ocorrer, ainda que em caráter educativo. A mudança coloca a área de Recursos Humanos (RH) em uma nova posição de protagonismo: se antes a saúde do colaborador era vista como responsabilidade exclusiva da medicina ocupacional, agora também cabe às lideranças e aos gestores de pessoas a tarefa de identificar áreas de risco psicossocial, desenvolver ações preventivas e fomentar uma cultura de cuidado. A partir de maio de 2026, começarão as punições previstas na norma.
Nesse novo cenário, as operadoras de saúde assumem um papel ainda mais relevante. Antes vistas apenas como suporte no tratamento de doenças, hoje podem se tornar parceiras estratégicas das empresas na promoção da saúde e do bem-estar. Por meio de programas de prevenção, diagnósticos de risco psicossocial, incentivo a hábitos saudáveis e ações de educação em saúde, é possível fomentar ambientes de trabalho mais equilibrados, reduzir afastamentos e aumentar a produtividade de forma sustentável.
Para que os programas de promoção da saúde nas empresas sejam realmente eficazes, é essencial que estejam estruturados em quatro pilares interdependentes: saúde mental, saúde física, saúde nutricional e qualidade do sono. Quando trabalhados de forma integrada, esses elementos não apenas promovem o bem-estar dos colaboradores, mas também reduzem significativamente os riscos de adoecimento.
Não por acaso, a Organização Mundial da Saúde estima que até 80% dos casos de doenças cardíacas, AVCs e diabetes tipo 2 poderiam ser prevenidos com a adoção de hábitos saudáveis relacionados à alimentação, prática regular de atividade física, controle do estresse e sono de qualidade.
A NR-1 é reflexo de uma transformação, uma convocação para que o bem-estar deixe de ser tratado como acessório e passe a ser reconhecido como um pilar estratégico para a sustentabilidade das empresas. Os próximos 12 meses exigirão planejamento, diálogo e responsabilidade para colocar em prática as novas diretrizes de forma efetiva e dentro da legalidade. Será um desafio, sim, mas também um avanço necessário. Cabe a todos nós — líderes, organizações, profissionais de saúde e de RH — assumir o compromisso de cuidar da saúde mental como parte essencial do futuro do trabalho.
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