Liderança, gestão e humanidade: aprendizados de 48 anos de trajetória

No fim da década de 1970, quando comecei a trabalhar, a área de RH ainda carregava forte influência de modelos tradicionais, hierárquicos e rígidos. Ao longo de mais de quatro décadas, testemunhei a ascensão e queda de múltiplos estilos de gestão, alguns extremamente controladores, outros mais abertos, alguns que sufocavam o potencial do colaborador, e outros que tentavam, mesmo que discretamente, devolver humanidade ao ambiente de trabalho. Essa trajetória me ensinou que a gestão evolui, mas a forma como olhamos para as pessoas determina a profundidade dessa evolução.

Com o passar dos anos, ocupei posições que exigiram grande responsabilidade: a direção de RH e planejamento de RH em duas grandes organizações (uma delas com mais de 100 mil colaboradores). Ali compreendi que nenhum CEO, presidente de conselho, diretor ou diretora deveria tomar decisões sozinho. A liderança solitária costuma ser sedutora porque oferece rapidez e sensação de poder, mas decisões de verdade, aquelas que moldam culturas e transformam negócios, só são sólidas quando acolhem a diversidade de conhecimento, experiências e perspectivas.

Acreditar em uma gestão compartilhada foi o que me acompanhou quando decidi criar minha própria empresa. Desde o início, fiz questão de evitar modelos que cerceiam o colaborador, como estruturas de controle excessivo, regras que infantilizam, processos que tratam pessoas como máquinas. Ao contrário, construí um ambiente onde a pluralidade é marca da nossa equipe. Ouvir, considerar, refletir, criar juntos e compartilhar os méritos fazem parte da rotina porque acredito que a inteligência coletiva sempre será maior do que a soma das competências individuais. Controlar demais sufoca. Confiar e dar sentido fortalece.

Também é importante reconhecer que meu jeito de liderar foi sendo lapidado pela vida, pela escuta, pelas pancadas recebidas e pela sensibilidade. Costumo dizer que lidero com firmeza, mas nunca sem carinho. E talvez esse seja um dos meus maiores aprendizados como mulher num mundo corporativo que, por muito tempo, confundiu força com dureza. Liderar com acolhimento não me tornou menos respeitada, ao contrário, me tornou mais inteira, próxima e aceita. Aos 64 anos, vejo que a maturidade não é um peso, mas um ativo que expande nossa visão de mundo, regula os impulsos, aumenta a sabedoria e fortalece nossos vínculos.

Enxergo, hoje, que a experiência não me dá respostas prontas, mas me dá as perguntas certas. E é fazendo as perguntas certas sobre pessoas, sobre cultura, sobre propósito, que continuamos evoluindo como líderes e como organizações. O mundo muda o tempo todo, mas a necessidade de tratarmos gente como gente sempre vai permanecer. E isso, acima de tudo, exige coragem.

Se há algo que desejo deixar como reflexão é que a verdadeira liderança não tem a ver com cargo, idade ou autoridade. Tem a ver com presença. Tem a ver com criar espaços onde as pessoas possam ser, contribuir e se sentir parte de algo maior. E é por isso que, depois de tantos anos, sigo acreditando que gestão é, antes de tudo, uma prática de humanidade.

Neiva Dourado Martins Mendes é atual presidente do Conselho e sócia-fundadora da Blue6ix Tecnologia

Isabel Braga é CEO da Closet BoBags e da BoGo. Ambas priorizam a Economia Circular e o aproveitamento, em respeito ao meio ambiente