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O Espólio do Engenho : O Abandono do Homem na Contabilidade da Autorregulação

 Armando Luís Francisco Armando Luís Francisco

Sob a alvorada tímida de uma regulamentação dita moderna, a autorregulação surge como senha sofisticada para a substituição do engenho humano pelo automatismo institucional. No papel, a CP CNSP 005/2025 oferece uma ode à responsabilidade e à concorrência, mas — ao alcance do olhar crítico — revela-se concerto de silêncios e apagamentos, cujos acordes enterram, juntos, dignidade profissional e tutela do consumidor.

Corretores outrora legitimados por legislação e prática, agora são vistos como engrenagens — convocados à restituição de comissões não por justa medida, mas pela volatilidade dos negócios e liquidações imprevistas, como se o labor e a confiança diante do cliente fossem “empréstimo” sujeito ao humor da central do capital. Profissão que era ponte torna-se travessia sem retorno; a intermediação é marcada como risco, e o risco, como estigma. A cada devolução, a cada penalização cumulativa, fere-se o engenho; e a cada nova minuta, apaga-se a biografia dos que geraram confiança social ao seguro.

A figura do corretor na autorregulação proposta não mais encarna o intérprete, o mediador “entre as angústias do incerto e as promessas da proteção” — mas sim o responsável pelo infortúnio alheio, compelido a responder pela falência de instituições que não controla, pela inadimplência de clientes que não escolheu. O trabalho convertido em “empréstimo precário”, a comissão transformada em débito condicional, o profissional em réu do acaso. Tal desenho representa o “prejuízo moral” e a “precarização sem redenção” — como se, para o mercado, não valesse mais a experiência, mas apenas o registro, a habilitação, a autorregulação dos representantes, a liquidez e a devolução.

E ao consumidor, o prejuízo é líquido e certo. A ausência do engenheiro do vínculo — do conselheiro hábil, do tradutor dos riscos — empurra o cidadão ao deserto do autoatendimento, ao labirinto dos contratos autoexecutáveis e das apólices opacas. O consumidor, solitário, “tateia entre as cláusulas e se vê desamparado diante de negativas, cancelamentos e exceções que jamais teria decifrado sozinho”. A renúncia à mediação humana é renúncia à justiça do cotidiano, à equidade das relações, à resposta ética diante da dor ou da dúvida.

Sob o império da autorregulação, a promessa de modernidade se transmuta em cartaz amargo: não é democratização, é abandono. Não é descentralização, é desresponsabilização. O engenho dos homens é sacrificado, e o consumidor come do fruto — mas não há sabor: apenas o conhecido gosto da solidão institucional.

Pedimos não apenas por mais garantias, mas pela reinvenção do olhar, pela reconstrução do vínculo, pela devolução da dignidade que se esvai entre os expedientes da minuta e os fluxos do mercado. Para o corretor, para o consumidor, é tempo de recusar esse espólio — porque, sem engenho e sem conselho, não há seguro, só risco.

Armando Luís Francisco
Jornalista


Fontes e citações

1-“O trabalho convertido em ‘empréstimo precário’, a comissão transformada em débito condicional, o profissional em réu do acaso.”
2-“A ausência do engenheiro do vínculo, do conselheiro hábil, do tradutor dos riscos, empurra o cidadão ao deserto do autoatendimento...”
3-Carta Aberta sobre a Ilegalidade Manifesta da Consulta Pública CNSP 005/2025
4-Susep retoma atualização e consolidação das regras de corretagem por meio de consulta pública


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