De compliance a foresight: Conselhos precisam evoluir para além do óbvio
Por: Thiago Mascarenhas - Conselheiro de Administração, Advisor em Estratégia, Governança & Sustentabilidade e Associado da Conselheiros TrendsInnovation
Conselhos de Administração ou Consultivos que se limitam ao compliance atuam olhando para o retrovisor. O compliance é fundamental, pois garante conformidade e credibilidade. No entanto, estar em compliance é apenas o ponto de partida de qualquer governança e de qualquer negócio. O conselho que atua exclusivamente nesse modelo é aquele que cumpre as formalidades legais e autorregulatórias, com uma postura voltada mais ao passado/presente. Nesse caso, os conselheiros atuam apenas quando demandados pela diretoria, olhando para dentro de casa e sendo passivos no dia a dia do negócio.
O mundo atual exige foresight: capacidade de antecipar tendências, mapear cenários e preparar a organização para agir antes que o futuro aconteça. Esse modelo requer um perfil de conselho e de conselheiros ativos, conectados com a diretoria, que vivenciem o negócio (respeitando a máxima nose in fingers out and elbows in), provocativos em relação ao presente e ao futuro.
Evidências mostram que empresas que incorporam foresight ao processo decisório, em especial ao planejamento estratégico, conseguem atravessar crises com mais resiliência, antecipar consequências de movimentos regulatórios e inovar antes da concorrência. É isso que diferencia conselhos que apenas agem no modelo “check the box” regulatório daqueles que lideram a transformação e o impacto.
Para ilustrar, dois exemplos mostram como o foresight, aliado à governança, pode transformar negócios e gerar impacto 360°:
WEG (Indústria): A WEG antecipou megatendências como energias renováveis e mobilidade elétrica utilizando foresight tecnológico. A empresa estruturou P&D voltado a cenários de transição energética e digitalização industrial, investindo mais de R$ 1,2 bilhão em inovação. O resultado: presença em 135 países, R$ 38 bilhões em receita líquida em 2024 (57% no exterior) e pontuação ESG 20% acima da média do setor — prova de que olhar adiante gera vantagem competitiva e impacto sustentável.
Magazine Luiza (Varejo): Em 2015, o Magalu lançou um plano de transformação digital baseado em foresight estratégico, prevendo a digitalização do consumo. Estruturou quatro pilares — inclusão digital, lojas físicas conectadas, omnicanalidade e marketplace — que permitiram à empresa crescer 3,6% em 2016, enquanto o setor caiu 15%. As vendas online saltaram 31% e passaram a representar 22,5% do total. Entre 2015 e 2020, suas ações se valorizaram de forma expressiva, mostrando como o foresight, aliado a uma execução consistente, pode transformar resultados.
A pergunta que não quer calar: como migrar do modelo de compliance para um conselho orientado por foresight e impacto? Seguem 7 passos para quem deseja iniciar essa jornada:
- Dedicação e balanceamento. Analise quanto tempo/horas por ano o conselho dedica a estudar cenários de presente e futuro, e não apenas o passado. Pela minha experiência prática, conselhos que atuam 20% olhando para o passado, 70% para o presente e 10% para o futuro apresentam desequilíbrio. Um modelo mais adequado seria 20%-50%-30%.
- Revisão do plano estratégico. Avalie se, nos últimos anos, o planejamento estratégico incorporou metodologias de foresight e mensuração de impacto, além das ferramentas tradicionais como SWOT ou PEST (boas, mas insuficientes).
- Planejamento sob nova perspectiva. Aprimore o processo de planejamento estratégico sob a ótica do impacto 360° e do foresight.
- Ajuste de rituais de governança. Alinhe os rituais e agendas de governança entre conselho e diretoria para incluir discussões sobre cenários e impacto. Eleve a frequência com que o tema “cenários” é debatido nas reuniões.
- Capacitação. Invista na formação de conselheiros e diretores para desenvolver essa nova mentalidade.
- Definição de compromissos. Durante o processo de planejamento estratégico, estabeleça compromissos e metas de impacto que serão acompanhados periodicamente pelo conselho e diretoria. Não se esqueça de desdobrar essas metas em objetivos anuais para toda a organização.
- Melhoria contínua. Revise o modelo após um ou dois ciclos anuais, promovendo aprimoramento constante.
Essa mudança de mentalidade e postura permite que o conselho cumpra seu papel de guardião da estratégia e dos valores, além de se tornar o grande incentivador da transformação com impacto.
O futuro não se espera, se constrói. Conselhos que entendem isso deixam de ser espectadores para se tornarem protagonistas.
Compartilhe:: Participe do GRUPO SEGS - PORTAL NACIONAL no FACEBOOK...:
<::::::::::::::::::::>