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Reembolso sem desembolso e as fraudes nos seguros-saúde

Artigo de Vera Valente e Angélica Carlini publicado no Blog Coluna do Estadão

A Lei n.º 9.656, de 1998, conhecida como Lei de Planos de Saúde, permitiu que seis diferentes modalidades de operadoras de saúde atuassem no setor: seguradoras; medicina de grupo; cooperativas; autogestão; odontologia e, entidades filantrópicas. As seguradoras devem obrigatoriamente oferecer livre escolha de médicos, hospitais, laboratórios e outros prestadores em saúde, com direito do beneficiário a receber parte do valor desembolsado no pagamento do serviço. As demais modalidades podem oferecer a livre escolha, embora não sejam obrigadas por lei.

Na livre escolha o beneficiário pode decidir quem será seu prestador de serviços em caso de consultas, exames, internações ou outro procedimento coberto pelo contrato. Depois de utilizar o serviço deve realizar o pagamento do valor e, em seguida, apresentar o comprovante para a operadora e receber o reembolso, sempre em conformidade com os cálculos e percentuais previstos no contrato.

Entretanto, é cada vez mais frequente observar práticas de reembolso sem desembolso. Mas a quem essas práticas interessam? É preciso deixar claro que o reembolso das despesas do beneficiário só pode ocorrer depois de: (i) ser prestado o serviço; (ii) ser pago o valor cobrado pelo prestador escolhido; e, (iii) ser comprovado o pagamento para a operadora de saúde.

Não há hipótese de reembolso sem efetivo pagamento ao profissional prestador do serviço de saúde, porque isso caracterizaria a negociação com o instrumento contratual o que é vedado em face das especificidades que os contratos de saúde suplementar possuem. Pela mesma razão, não cabe ao beneficiário a prática de cessão de direito porque, a rigor, antes da análise dos documentos apresentados ele sequer sabe se possui ou não um direito, uma vez que a situação será analisada à luz do contrato e de toda a regulação aplicável ao setor.

Importante ressaltar, ainda, que o reembolso sem efetivo pagamento caracterizaria uma transação financeira possível de sustentar práticas ilícitas como a lavagem de dinheiro e corrupção, o que é ilegal no âmbito das atividades de saúde suplementar. O pagamento direto ao prestador deverá ser feito apenas quando ele participa de rede credenciada e, caso não participe, somente poderá receber diretamente do beneficiário.

O reembolso dos valores despendidos pelos usuários dos planos de saúde não ocorre de forma automatizada, mediante simples comprovação de efetivação dos gastos. É preciso que a operadora de saúde conheça o procedimento realizado, verifique se este se encontra coberto pelo contrato ou pelo rol de procedimentos da ANS e, principalmente, se é compatível com diretrizes de utilização para o caso concreto diagnosticado. Essa maneira de proceder decorre da responsabilidade que tem a operadora de saúde pela organização e administração do fundo mutual, cujos recursos pertencem aos beneficiários e, de onde serão retirados os valores necessários para o pagamento de todos os procedimentos de saúde de todos os beneficiários.

A operadora de saúde tem dever legal de zelar pelos valores do fundo mutual, por isso os pedidos de reembolso são analisados e os documentos comprobatórios criteriosamente verificados. Qualquer falha praticada pela operadora de saúde poderá gerar implicações de natureza administrativa, civil e penal, porque o fundo mutual será prejudicado.

Em 22 de novembro de 2022, no julgamento do RESp n.º 1.959.929/SP, que teve como relator o Ministro Marco Aurélio Bellizze, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, entendeu que: o reembolso sem desembolso é uma prática não prevista na Lei n.º 9.656, de 1998, e exatamente por isso, é ilegal e sujeita às consequências sancionatórias, tanto em esfera civil como criminal. De acordo com a sentença: Sem lei específica ou regulamento expressa da ANS não há como permitir que clínicas ou laboratórios não credenciados à OPS criem uma nova forma de reembolso: reembolso assistido ou auxiliado em completo desvirtuamento da própria lógica preconizada pela Lei nº 9.656 dando margem inclusive a situações de falta de controle da verificação da adequação e dos valores das consultas, procedimentos, exames solicitados, o que poderia prejudicar todo o sistema atuarial do seguro e em último caso aos próprios beneficiários.

Não há, portanto, fundamento fático ou jurídico que possa ser utilizado para sustentar a licitude e a contratualidade do reembolso sem desembolso. Se o beneficiário tem dificuldade em desembolsar antecipadamente pode utilizar a rede referenciada oferecida pela operadora de saúde e que, certamente, possui bons profissionais e prestadores de serviços.

O que não tem lógica, como menciona expressamente a decisão do STJ e, tão pouco legalidade, é que o beneficiário possa utilizar o contrato com a operadora de saúde suplementar como instrumento de operações financeiras, em evidente utilização indevida do instituto do reembolso, a favorecer, inclusive, práticas ilícitas na circulação de valores e eventuais fraudes que trarão imensos prejuízos para os demais beneficiários, participantes do fundo mutual.

*Vera Valente, advogada e diretora executiva da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde); Angélica Carlini, pós-doutorado em Direito Constitucional e docente do Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da Universidade Paulista (UNIP)


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