Premiado jornalista alemão confessa que inventava histórias e personagens de suas reportagens

A revista alemã Der Spiegel vive um pesadelo depois revelar que um dos principais repórteres falsificou suas reportagens por anos. A imprensa internacional também ficou chocada com as revelações de que o premiado jornalista Claas Relotius tinha, de acordo com o próprio periódico, "criado histórias e inventado personagens" em ao menos 14 dos 60 textos que foram publicados em suas edições online e impressas, alertando que outros meios de comunicação podem ter sido afetados.

Relotius, de 33 anos, pediu demissão depois de admitir o escândalo. Ele tinha trabalhado na Der Spiegel por sete anos e venceu inúmeros prêmios por suas reportagens investigativas, incluindo o troféu Jornalista do Ano da rede estadunidense CNN, em 2014. No começo de dezembro, ele ganhou o prestigiado prêmio Reporterpreis, em seu país, depois de escrever sobre um garoto sírio refugiado na Alemanha. Os jurados escolheram o texto pelo "brilhantismo, poesia e relevância". Semanas depois emergiram informações de que todas as fontes da matéria eram estranhas e que muitas delas eram invenções.

A falsificação foi descoberta depois que um colega que trabalhou com ele em uma reportagem sobre a fronteira entre os Estados Unidos e o México suspeitou de alguns dos detalhes da reportagem publicada por Relotius. O jornalista Juan Moreno, então, localizou duas supostas fontes citadas no texto, publicado no Der Spiegel em novembro. As duas disseram que nunca tinham visto o repórter alemão. Relotius ainda mentiu sobre ter visto uma placa pintada com os dizeres "Mexicanos, fiquem fora dos EUA", afirma uma investigação posterior da revista.

Outras fraudes incluem uma reportagem sobre um prisioneiro do Iêmen na prisão de Guantánamo, em Cuba, e outra sobre o jogador de beisebol estadunidense Colin Kaepernick. A revista teria pedido para acessar seu computador em busca de mais pistas sobre outras fontes inexistentes.

Em um longo editorial, a Der Spiegel, fundada em 1947 em Hamburgo, famosa pelas investigações jornalísticas e que vende cerca de 725 mil cópias impressas por semana e tem um site com mais de 6,5 milhões de leitores, disse que estava "chocada" com a descoberta e pediu desculpas aos leitores e a qualquer pessoa que tenha sido objeto das "citações fraudulentas, dos detalhes pessoais inventados ou das cenas e lugares criados" pelo repórter.

A revista ainda afirmou que Relotius cometeu uma fraude jornalística "em grande escala" e que o episódio é um dos piores "em 70 anos de história" da Der Spiegel. Uma comissão foi criada para examinar todos os textos que o jornalista escreveu durante os sete anos em que trabalhou na redação. Relotius ainda escreveu reportagens para outros veículos de imprensa alemães, como os jornais Taz, Welt e Frankfurter Allgemeine Sunday. O Welt tuitou que o repórter "abusou do seu talento".

Relotius, por sua vez, afirmou ao Der Spiegel que estava arrependido e envergonhado, segundo a revista. "Eu estou doente e preciso de ajuda", teria dito ele, de acordo com o editorial. Juan Moreno, que trabalha para a publicação alemã desde 2007, disse que arriscou sua própria carreira quando confrontou outros colegas de redação com suas suspeitas, já que muitos deles desacreditaram das denúncias.

"Por três ou quatro semanas, Moreno foi ao inferno, porque seus colegas e seu chefe não queriam acreditar nas suas acusações", disse a Der Spiegel em seu pedido de desculpas. Por várias semanas, ao contrário, Relotius foi considerado vítima de um complô liderado pelo jornalista mexicano. Na metade de dezembro, porém, o repórter resolveu confessar as mentiras em uma reunião com o editor da revista.

Segundo a Der Spiegel, em sua confissão, ele disse que inventava personagens porque "tinha medo de fracassar". "A pressão para não falhar foi aumentando à medida que eu ia me tornando famoso", afirmou.